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sábado, 22 de abril de 2006

O mestre que os deuses do futebol esqueceram

Helio Fernandes, na Tribuna da Imprensa

Tristeza, lamento, insatisfação, incompreensão, decepção, até mesmo revolta com a morte do maior técnico de todos os tempos do futebol brasileiro. Chamado de professor por direito de conquista, embora não exibisse o mínimo da arrogância que outros ostentam sem merecer. O que eu digo no título destas notas é rigorosamente verdadeiro, nenhuma contestação.

Telê convocou, formou, treinou e comandou as duas maiores seleções não campeãs do Brasil. De 1982 e 1986. E das que conquistaram a Copa do Mundo, só uma incontestável, incontrastável e até incomparável: a de 1970. Formada e classificada por João Saldanha, jogaria e ganharia sem ninguém gritando tolamente de fora do campo. Essa, pelos jogadores, era e foi invencível.

Depois de Telê vieram as seleções campeãs de 1994 e a de 2002. 1994 registrou a pior Copa do Mundo, até piores do que as de 1930 e 1934, que poucos viram. (João Saldanha me dizia que viu as duas. Como em 1930 estava com quase 10 anos, morando no Rio Grande do Sul, quase na fronteira com o Uruguai, nada difícil. Na de 1934, já era um senhor de 14 anos).

Em 1994, vitória nos pênaltis, depois da classificação em cima da Holanda com aquele "gol espírita" do Branco. E antes, nas eliminatórias, quase a desclassificação. Parreira não queria convocar Romario, então com 28 e em plena forma. Obrigado pelas circunstâncias, Romario foi convocado, fez o gol do último instante da eliminatória e depois foi o jogador da Copa.

2002 com fatores inteiramente favoráveis, o que não aconteceu com Telê Santana. O sucesso não chega nem consagra os melhores, é dos mais sortistas, escolhidos pelo destino. O Brasil devia, obrigatoriamente, ter sido campeão de 1982 e de 1986. Telê formou e comandou essas seleções que encantaram o mundo e até hoje são lembradas. Ou melhor: são e serão sempre inesquecíveis.

Foi com Telê Santana, principalmente por causa de Telê Santana, que surgiu o que se chamou durante quase 20 anos de "futebol arte" ou de "futebol espetáculo". E era mesmo. Mas não se mostrava apenas para alguns iluminados ou entendidos, também ganhava jogos. Ou perdia de forma surpreendente. Substituída depois pelo "futebol de resultados", que eleva à glória os que se cobrem com a bandeira da mediocridade.

Chorando com a morte de um homem como Telê Santana, temos que chorar também diante de duas derrotas, duas seleções memoráveis, duas equipes de Telê Santana com extraordinários jogadores, que apesar disso não ostentam nenhum título mundial. Enquanto outros, até mesmo sem entrarem em campo, são "gloriosamente" pentacampeões.

As duas derrotas desesperadoras, e das quais todos se lembram com o coração saltando. A primeira em 1982, contra a Itália, perdão, contra Paolo Rossi. E a segunda, 1986, contra a França, decidida nos pênaltis. Mas foi o melhor e o mais empolgante de todos os jogos que vi pelos estádios do mundo. Quando Telê ficou mortalmente doente, sempre acreditei que era a depressão e a decepção com um destino ingrato e poderoso.

Revendo na memória os lances desses dois jogos, a certeza de que podíamos ganhá-los, e de que alguns dos maiores jogadores do Brasil têm que ser comparados a todos os de 1970. Mas Telê ficou sem título, sem saúde, sem futuro. Morre muito moço, numa era em que a longevidade é muito maior do que o tempo que viveu.

PS - Telê é inesquecível. As seleções de 1982 e 1986, também. Neste 21 de abril, acrescentamos a morte de Telê ao sacrifício de Tiradentes, à morte de Tancredo. Não há exagero ou impropriedade na comparação.

PS 2 - Espero que reverenciem Telê, que o povo aplauda quando passar o seu caixão. Aplauso, não para a morte mas para a vida. Reverência, respeito, saudade, ninguém merece mais do que Telê Santana no País do futebol.

Enviado por JEO Bruno.

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